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Ceratocone e Insclusão Social

Ceratocone pede novas regras de inclusão social *Leôncio Queiroz Neto

A falta de informação sobre a saúde ocular faz nossa legislação não identificar a necessidade de regras mais flexíveis para inclusão social de quem tem ceratocone. A doença afina e deforma a córnea, lente externa do olho e no Brasil é a maior causa de transplantes. As dificuldades diárias relatadas pelos portadores não são poucas. “No carro com meu marido quando vi luzes vermelhas piscando lá na frente podia jurar que era um comando de policiais, mas quando nos aproximamos vi que era só uma bicicleta com lanternas traseiras”, conta A. B. “Já chamei meu pai para matar um tufo de cabelo pensando que era uma barata. Outro dia corri de uma sacola na rua pensando ser um cachorro”, diz B. N. As confusões não param por aí. Pacientes contam que já entraram em carro errado, se perderam no shopping, procuram os óculos que estão no rosto, cumprimentam pessoas sem saber quem são ou passam por esnobes por não cumprimentar amigos próximos.

Apesar disso a acuidade visual de muitos dos que têm ceratocone é maior que os 0,05 que caracteriza cegueira, ou 0,3 a 0,05 de acuidade visual que caracteriza baixa visão na Lei de Cotas criada para garantir reserva de vagas a deficientes visuais em empresas com mais de 100 funcionários. Pior: a doença vem crescendo aceleradamente no Brasil. Isso porque, tem como principal fator de risco o hábito de cocar os olhos. Para se ter ideia. hoje a estimativa da OMS (Organização Mundial da Saúde) é de que 30% dos brasileiros são alérgicos e 7 em cada 10 pessoas deste grupo manifestam alergia ocular.

O crescimento da alergia está relacionado à poluição, excesso de limpeza, partos por cesárea e uso precoce de antibióticos, variáveis que fazem o sistema imunológico ficar “preguiçoso”. De tanto esfregar os olhos, quem tem ceratocone fragiliza as fibras de colágeno da córnea que afina, sofre alteração na curvatura e toma o formato de um cone. Os sintomas são visão distorcida, formação de imagens fantasmas, maior sensibilidade à luz e dificuldade para enxergar à noite. Vale ressalta que no início a doença pode ser confundida com vício de refração: miopia (dificuldade de enxergar à distância), hipermetropia (dificuldade para enxergar próximo) ou astigmatismo (visão desfocada para perto e longe). Por isso, crianças e adolescentes que coçam os olhos com frequência devem passar por tomografia da córnea para flagrar o ceratocone em fase inicial. Isso porque, embora no início seja possível corrigir o ceratocone com óculos, conforme a doença evolui é necessário usar lentes de contato que podem se tornar muito desconfortáveis devido ao formato da córnea. A boa notícia é que hoje já é possível interromper a evolução do ceratocone através do crosslinking. O tratamento fortalece em até três vezes a resistência da córnea através da aplicação de riboflavina (vitamina B2) e luz ultravioleta (UVA).

Embora poucos percam a visão, o espectro da cegueira persegue quem tem diagnóstico de ceratocone o tempo todo. A frequente mudança de grau em plena adolescência quando surge a maioria dos casos, somada à descoberta da doença em estágio intermediário por grande parte dos portadores, muitas vezes impede a aplicação do crosslink nos casos em que a córnea é mais fina que o protocolo do tratamento. Por isso, a inclusão social desta parcela da população requer políticas públicas de saúde que viabilizem outros tratamentos para oferecer boa correção visual.

Entre eles destaco a adaptação de lente de contato escleral, modelo que tem um diâmetro maior e se apoia na esclera, parte branca do olho. Hoje a adaptação de lente também pode ser personalizada por uma tecnologia que faz a impressão digital de todo a superfície ocular, incluindo a córnea e a esclera. É o fim do desconforto e olho irritado causados por lentes de contato. Outra terapia que pode evitar o transplante é o implante do anel intraestromal, órtese implantada na camada intermediária da córnea, que aplana seu formato e melhora a visão.

Para empresas as principais dicas que melhoram a produtividade de funcionários com ceratocone são: calibração da luz no ambiente de trabalho e evitar locais diretamente expostos ao sol que atrapalha muito a visão de quem tem a doença. Para professores as principais recomendações são: fornecer material impresso com fonte maior, escrever grande, legível e em cores contrastantes na lousa, ampliar provas, dar mais tempo para responder provas. Afinal é a soma das ações que faz uma sociedade melhor.

*Leôncio Queiroz Neto – Presidente do Instituto Penido Burnier, membro do CBO (Conselho Brasileiro de Oftalmologia) e da ABCCR (Associação Brasileira de Catarata e Cirurgia Refrativa).

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